Ao menos 40 refugiados rohingyas de Mianmar, entre eles cerca de 15 cristãos, teriam sido forçados pela Marinha da Índia a entrar no mar perto da fronteira marítima com Mianmar em 8 de maio.
Segundo informações da agência Associated Press (AP), que citou familiares das vítimas, fontes ligadas à ONU e um advogado, os detidos foram levados de Nova Déli para um porta-aviões da Marinha indiana após serem presos em 6 de maio. No local, os militares teriam retirado suas vendas e amarras, fornecido coletes salva-vidas e ordenado que nadassem até uma ilha em território birmanês.
Embora tenham alcançado a costa, o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos afirmou, em nota publicada em 15 de maio, que o paradeiro dos refugiados é desconhecido. No dia seguinte, 16 de maio, a AP informou que cinco refugiados entrevistados relataram ter parentes entre os enviados ao mar. Entre eles, havia mulheres, crianças e idosos.
Tom Andrews, relator especial da ONU sobre a situação dos direitos humanos em Mianmar, classificou o ato como um “flagrante desrespeito às vidas e à segurança daqueles que necessitam de proteção internacional” e disse que a medida foi “nada menos que ultrajante”.
Em nota, Andrews declarou: “Tais ações cruéis seriam uma afronta à decência humana e representam uma grave violação do princípio de não repulsão, um princípio fundamental do direito internacional que proíbe os Estados de devolverem indivíduos a um território onde enfrentam ameaças às suas vidas ou liberdade”.
O Comissariado da ONU informou ter nomeado um perito independente para investigar os “atos inaceitáveis e inconcebíveis”. A agência da ONU também solicitou formalmente ao governo indiano que “se abstenha de tratamento desumano e com risco de vida aos refugiados rohingya, incluindo sua repatriação para condições perigosas em Mianmar”.
O advogado Dilawar Hussain, que representa os refugiados, afirmou que familiares das vítimas ingressaram com uma petição na Suprema Corte da Índia, solicitando o retorno de seus parentes a Nova Déli. Procurados pela AP, o Ministério das Relações Exteriores da Índia e a Marinha indiana não se pronunciaram.
Um refugiado rohingya residente na Índia, cujo nome foi mantido em sigilo por razões de segurança, relatou que seu irmão conseguiu entrar em contato após nadar até uma ilha em Mianmar. Ele teria usado o telefone emprestado de um pescador local para informar que as autoridades indianas os haviam forçado a pular no mar.
Outro refugiado relatou que alguns dos integrantes do grupo teriam sido agredidos por militares indianos. A AP destacou que essas alegações não puderam ser verificadas de forma independente até o momento. Também não houve resposta do governo militar de Mianmar ao pedido de comentário enviado por e-mail pela agência.
A população rohingya, predominantemente muçulmana, é historicamente perseguida em Mianmar e também na Índia, onde vive uma comunidade estimada em 40 mil refugiados. Conversos ao cristianismo também são alvo de hostilidades. Em Mianmar, o governo nega cidadania à etnia rohingya, alegando que são migrantes ilegais vindos de Bangladesh. Os rohingyas, por sua vez, afirmam ser nativos do estado de Rakhine, no oeste do país.
Antes da ofensiva militar de 2017 — que resultou na fuga de mais de 740 mil rohingyas para Bangladesh — a população desse grupo em Mianmar era estimada em 1,4 milhão de pessoas. Autoridades locais impõem severas restrições ao deslocamento, ao acesso à educação e ao emprego público da comunidade.
Organismos internacionais como a ONU e a Human Rights Watch descreveram a repressão aos rohingyas como “limpeza étnica”. Investigações conduzidas por missões da ONU identificaram relatos de incitação ao ódio por parte de budistas ultranacionalistas, além de práticas sistemáticas de prisões arbitrárias, execuções sumárias, tortura e trabalho forçado.
De acordo com o portal Christian Daily, a composição religiosa de Mianmar é formada por 87,9% de budistas, 6,2% de cristãos, 4,3% de muçulmanos, 0,8% de animistas e 0,5% de hindus.