Dias após o massacre de centenas de pessoas no estado de Benue, o presidente da Nigéria, Bola Ahmed Tinubu, reuniu-se com autoridades em 17 de junho na capital Makurdi, pedindo a prisão dos responsáveis. O ataque, ocorrido entre os dias 13 e 14 de junho, vitimou principalmente mulheres e crianças, segundo o grupo Christian Solidarity Worldwide (CSW).
Durante o encontro, o líder tradicional supremo da etnia Tiv, James Ortese Iorzua Ayatse, discordou da narrativa oficial de que os ataques seriam consequência de conflitos entre pastores de gado da etnia fulani e agricultores. “Não se trata de confrontos entre pastores e agricultores, nem de confrontos comunitários ou ataques de represália”, declarou Ayatse, segundo o site TruthNigeria. “É uma invasão genocida e uma campanha de grilagem de terras calculada, bem planejada e em larga escala, por pastores terroristas e bandidos”.
Segundo relatos locais e organizações de defesa, o massacre em Yelwata teria sido executado por milícias Fulani, grupo majoritariamente muçulmano. De acordo com a CSW, os agressores atacaram por volta das 22h do dia 13 de junho, inicialmente tentando invadir uma missão cristã que abrigava mais de 400 deslocados internos. Após serem repelidos, incendiaram o mercado principal da vila e mutilaram corpos de vítimas.
Em resposta ao ocorrido, Tinubu questionou o chefe da polícia federal, Kayode Egbetokun, sobre a ausência de prisões. “Como é que ninguém foi preso?”, perguntou o presidente, segundo o TruthNigeria. Ele também orientou os chefes das Forças Armadas e da inteligência a intensificarem a busca pelos agressores. “Vamos pegar esses criminosos”, afirmou.
A CSW indicou que os assassinatos em Yelwata fizeram parte de uma sequência de ataques no condado de Guma, com outros incidentes registrados nos dias 8, 11 e 12 de junho em localidades como Udei, Tse Ivokor, Unongu e Daudu. Ao todo, mais de 6.500 pessoas foram deslocadas apenas em junho, segundo estimativas da entidade. Entre 1º de abril e 1º de junho, 270 mortes foram contabilizadas no estado de Benue.
Em nota divulgada após o massacre, a Comissão dos EUA sobre Liberdade Religiosa Internacional (USCIRF) voltou a pedir que a Nigéria seja classificada como “País de Preocupação Particular (CPC)” pelo Departamento de Estado norte-americano. “A violência abominável no Cinturão Médio da Nigéria (…) indica que os esforços de prevenção do governo estão falhando”, disse Vicky Hartzler, presidente da comissão.
O comissário Mohamed Elsanousi reforçou que os EUA devem usar a assistência externa para apoiar o treinamento das forças de segurança e proteger as comunidades religiosas vulneráveis.
Relatos da Associated Press e da organização Ajuda à Igreja que Sofre (ACN) apontam que os atacantes chegaram de várias direções, gritavam “Allahu Akbar” e destruíram plantações suficientes para alimentar a população local por um ano. A ACN relatou que até 700 deslocados internos dormiam em uma igreja da vila, a Igreja de São José, que também foi alvo de tentativa de invasão antes do ataque ao mercado.
Segundo documento do Grupo Parlamentar Multipartidário para a Liberdade ou Crença Internacional (APPG) do Reino Unido, publicado em 2020, parte dos Fulani adere à ideologia radical islâmica. “Eles adotam uma estratégia comparável à do Boko Haram e do ISWAP e demonstram uma clara intenção de atingir cristãos e símbolos poderosos da identidade cristã”, afirma o relatório.
A Missão Portas Abertas, que monitora a perseguição religiosa global, classificou a Nigéria como 7º país mais perigoso do mundo para cristãos em sua Lista Mundial de Perseguição 2025. Entre os 4.476 cristãos assassinados por sua fé no mundo entre 2024 e 2025, 3.100 (69%) ocorreram na Nigéria, segundo o levantamento.
A organização aponta que milícias Fulani têm atacado comunidades agrícolas cristãs no centro-norte do país, enquanto grupos jihadistas como o Boko Haram, o Estado Islâmico na Província da África Ocidental (ISWAP) e o novo grupo Lakurawa, filiado à Al-Qaeda e originário do Mali, também atuam em outras regiões. A expansão da violência atingiu inclusive os estados do sul, onde se observam novos focos de instabilidade.
Líderes cristãos locais afirmam que os ataques visam forçar a tomada de terras e promover a islamização de áreas tradicionalmente cristãs. Segundo esses líderes, a desertificação tem contribuído para a migração forçada de pastores em busca de recursos, intensificando os conflitos.
Com milhares de mortos e centenas de milhares de deslocados, o estado de Benue continua sendo um dos epicentros da violência religiosa na Nigéria, enquanto autoridades nacionais e internacionais divergem sobre as causas e a resposta adequada à crise, segundo informações do The Christian Post.