Aproximadamente 200 pessoas, a maioria cristãos, foram mortas em um ataque de jihadistas Fulani na comunidade de Yelwata, localizada em Guma, no estado de Benue, Nigéria. O número de vítimas ainda está sendo apurado, com estimativas divergentes entre autoridades locais, organizações de direitos humanos e líderes religiosos.
O ataque teve início na noite da sexta-feira passada, 13 de junho, quando homens armados invadiram Yelwata, uma vila agrícola com maioria católica situada a menos de oito quilômetros da capital do estado, Makurdi. Segundo relatos, os agressores incendiaram casas e mataram os moradores, incluindo famílias inteiras que teriam sido trancadas em seus quartos antes do incêndio.
Estimativas variam entre 45 e 200 mortos
O porta-voz do governo estadual, Tersoo Kula, informou que o ataque durou cerca de duas horas e resultou na destruição de dezenas de casas. Segundo ele, a contagem oficial, até o momento, é de 45 mortos, número verificado por agentes do governo e policiais enviados ao local.
A Anistia Internacional, por outro lado, afirmou que mais de 100 pessoas foram mortas no episódio. Já a organização Truth Nigeria, que atua no monitoramento da perseguição a cristãos no país, reportou mais de 200 vítimas fatais.
Em declaração ao jornal Catholic Star, o padre Moses Aondover Iorapuu, Vigário Geral e Diretor de Comunicações da Diocese de Makurdi, afirmou: “O recente ataque a Yelwata, no estado de Benue, que deixou mais de 200 mortos ou queimados irreconhecíveis, é um lembrete sombrio das lutas diárias enfrentadas por muitos cidadãos de Benue”.
A Anistia Internacional também relatou que “muitas pessoas ainda estão desaparecidas”, que há dezenas de feridos sem atendimento médico e que os corpos de várias vítimas foram queimados a ponto de se tornarem irreconhecíveis.
Frustração com as autoridades
Em entrevista ao portal Crux, padre Iorapuu classificou o ataque como “bárbaro” e criticou a inação das forças de segurança. “Esses agressores são animais e bárbaros. Algumas das vítimas já foram deslocadas em ataques anteriores desses grupos malignos”, afirmou. Ele ainda destacou que militares e policiais estavam próximos da missão onde se abrigavam os deslocados, mas conseguiram apenas impedir que os agressores invadissem a casa da missão.
Yelwata abrigava um número significativo de pessoas deslocadas internamente (IDPs), que haviam fugido de ataques similares em comunidades vizinhas. Segundo o pároco, muitos desses deslocados foram novamente vítimas da violência.
Histórico de ataques na região
O ataque em Guma não é um episódio isolado. Em maio de 2025, pelo menos 20 pessoas foram assassinadas em Gwer West, também no estado de Benue. Em abril, ao menos 40 cristãos foram mortos em um ataque semelhante no estado vizinho de Plateau.
O padre Iorapuu alertou para o impacto desses episódios na composição demográfica cristã da Nigéria e mencionou o testemunho do bispo Wilfred Anagbe perante legisladores nos Estados Unidos, em 14 de fevereiro de 2024, como um possível estopim para a escalada da violência. “Esperávamos que os ataques se intensificassem após o testemunho do bispo… mas acreditávamos que o aviso dos EUA faria o governo ser proativo; erramos novamente”, disse ao Crux.
O bispo Anagbe havia advertido que os cristãos estavam sendo alvo de genocídio religioso e solicitou apoio da comunidade internacional. Após seu testemunho, o religioso passou a receber ameaças de morte.
Acusações de inação governamental
Líderes locais e entidades de direitos civis também questionam a postura do governo federal diante da violência. Segundo Iorapuu, o presidente da área de governo local de Guma afirmou publicamente que os agressores são “fulanis”, e não apenas “pastores ou bandidos”, como vinham sendo descritos. “As evidências confiáveis de quem eles são são inegáveis, então por que o governo é incapaz de garantir a segurança de seus cidadãos?”, questionou o padre.
O ativista Emeka Umeagbalasi, diretor da organização Intersociety, declarou que a passividade das autoridades reflete uma “agenda deliberada”. Segundo ele, essa suposta agenda teria se intensificado durante o governo do ex-presidente Muhammadu Buhari, que governou a Nigéria de 29 de maio de 2015 a 29 de maio de 2023. Umeagbalasi afirmou que Buhari, descendente de um chefe Fulani, armou o grupo e favoreceu membros muçulmanos em cargos de poder, enquanto “relegava os cristãos a uma posição secundária”.
“Temos um exército jihadista”, declarou Umeagbalasi, referindo-se ao acesso dos Fulani a armamentos estatais e à alegada islamização das forças de segurança durante o último mandato de Buhari.
Contexto
O estado de Benue, conhecido por sua população majoritariamente cristã e vocação agrícola, tem sido alvo recorrente de conflitos envolvendo pastores Fulani, grupo étnico de maioria muçulmana, tradicionalmente associado ao pastoreio nômade. Conflitos por terras agrícolas, agravados por motivações religiosas e étnicas, têm alimentado tensões na região central da Nigéria, conhecida como “Cinturão Médio”.
Apesar dos compromissos assumidos pelo atual presidente Bola Tinubu, que prometeu proteger vidas e propriedades durante pronunciamento em 12 de junho, os episódios de violência continuam desafiando a capacidade do governo nigeriano de garantir segurança e justiça às comunidades afetadas.
The Nigerian authorities must immediately end the almost daily bloodshed in Benue state and bring the actual perpetrators to justice.
The horrifying killing of over 100 people by gunmen that invaded Yelewata; from late Friday into the early hours of Saturday 14 June 2025, shows…
— Amnesty International Nigeria (@AmnestyNigeria) June 14, 2025