Desde o golpe militar de 01 de fevereiro de 2021, Mianmar mergulhou em uma guerra civil que intensificou a perseguição a comunidades cristãs no país. O pastor Yang (pseudônimo), sua esposa e seus filhos vivem há anos em constante fuga, tentando escapar da violência armada e dos bombardeios que atingem civis em diversas regiões do território birmanês.
“Corremos e rastejamos sob o fogo cruzado. Às vezes, passamos a semana inteira buscando um refúgio seguro, lutando para sobreviver. As bombas continuam caindo atrás de nós”, relatou o pastor em uma entrevista divulgada por organizações cristãs internacionais.
A família se abriga atualmente sob uma lona em plena floresta, onde não há acesso a água potável ou alimentos, e o choro das crianças é constante. “Se descobrirem nosso esconderijo, os bombardeios recomeçarão. Não temos nada”, acrescentou.
A situação descrita por Yang é semelhante à de milhares de cristãos em Mianmar que, após o golpe de Estado, enfrentam repressão armada, destruição de igrejas e deslocamento forçado. Dados divulgados por organizações humanitárias estimam que cerca de 40 mil cristãos foram forçados a deixar suas casas ou se esconder em apenas um ano após o início do conflito.
Antes de viver em fuga, Yang liderava uma pequena igreja e morava com sua família em uma região urbana. O pastor recorda que a primeira ameaça veio logo após o golpe, quando foi abordado por policiais em um mercado local. “Sentimos-nos inseguros e decidimos fugir”, relembrou. O receio se concretizou meses depois, quando membros da congregação foram vendados e ameaçados com armas. Em outra ocasião, o líder cristão teve sua motocicleta e uma reserva financeira – equivalente a dois meses de salário – roubadas.
As tentativas de manter contato com fiéis da igreja tornaram-se extremamente arriscadas. “Os membros da minha igreja estão espalhados por toda parte. É extremamente perigoso tentar visitá-los, pois, a qualquer momento, em qualquer lugar, podemos ser vítimas de bombardeios e tiroteios”, afirmou.
Além do sofrimento físico e emocional, Yang relata uma crise espiritual enfrentada por muitos cristãos deslocados: “Sinto-me impotente por não conseguir proteger minha família. Em momentos de desespero, chegamos a duvidar da presença de Deus”, confessou. A falta de alimentos, abrigo e segurança fragiliza a fé de famílias que, mesmo assim, continuam buscando consolo na oração.
“Quando saio para comprar comida, minha oração é: ‘Deus, ajude-me a voltar em segurança’”, relatou o pastor, descrevendo o medo constante de ataques durante ações básicas do cotidiano.
Apesar das adversidades, Yang reconhece o apoio espiritual de igrejas ao redor do mundo como essencial para sua resistência. “Sabemos que as orações dos cristãos ao redor do mundo nos protegem. Nossa família se une em oração todas as noites, pedindo a Deus que nos fortaleça”, declarou. Segundo ele, a fé tem sido a principal força para suportar o sofrimento. “Às vezes, a vontade de desistir é grande, mas somos encorajados a seguir em frente e servir ao Senhor.”
Desde 2021, diversas províncias de Mianmar, incluindo Chin, Kachin, Karen e Kayah, onde há presença significativa de cristãos, foram duramente afetadas por ofensivas do Exército birmanês.
A Organização das Nações Unidas e entidades de direitos humanos têm denunciado repetidamente o uso de força desproporcional contra civis, incluindo o uso de ataques aéreos e destruição de locais de culto, segundo a Missão Portas Abertas.