O desembargador Kassio Nunes Marques está sob intenso escrutínio e parte de seu currículo, informado no site do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1), é questionado por incongruências ligadas às universidades onde ele teria cursado seu pós-doutorado.
A principal dúvida surge no curso de pós-graduação que Kassio Nunes Marques diz ter feito na Universidad de La Coruña, na Espanha. A instituição não reconhece sua participação em nenhum programa dessa natureza, e diz que o curso de “Contratación Pública” que o desembargador elenca em seu currículo não é ministrado por ela.
“Informamos que a Universidade de La Coruña não ministrou nenhum curso de pós-graduação com o nome de Postgrado en Contratación Pública”, disse a instituição ao jornal O Estado de S. Paulo.
Entretanto, a universidade admite que Kassio Nunes participou de um curso de cinco dias “como ouvinte”. Essa série de palestras, chamada “I Curso Euro-Brasileiro de Compras Públicas”, foi organizada pela Universidade da Coruña em parceria com o Programa Ibero-Americano de Doutorado de Direito Administrativo, a Rede Ibero-americana de Compras Públicas, o Instituto Brasileiro de Estudos Jurídicos de Infraestrutura e Grupo de Pesquisa de Direito Público Global, tendo sido “realizado na Escola de Direito da Corunha entre 1 e 5 de setembro de 2014”.
Outras universidades
Além do curso de pós-graduação que a Universidade de La Coruña não reconhece, outros dois do mesmo grau foram questionados, ambos alegadamente feitos na Universidade de Salamanca, também na Espanha.
O primeiro deles, um doutorado em Direito com especialização em Administração, Fazenda e Justiça, é confirmado pela universidade através de seu site. Já o segundo, um pós-doutorado em Direitos Humanos, não consta no banco de dados públicos da Universidade de Salamanca.
Porém, um detalhe peculiar sobre a conclusão do doutorado na Universidade de Salamanca chama a atenção: a tese foi defendida há apenas 12 dias, em 25 de setembro de 2020.
Mais um curso de pós-doutorado consta no currículo de Kassio Marques, o de Direito Constitucional, pela Universidade de Messina (Universitá Degli Studi di Messina), na Itália. A instituição foi questionada, mas não se posicionou sobre a participação ou não de Kassio Nunes Marques em seu curso.
O mesmo ocorre com outra pós-graduação, em Ciências Jurídicas, que o desembargador diz ter cursado pela Faculdade Maranhense – MA. Nenhuma instituição de Ensino Superior com esse nome, que ofereça essa pós-graduação, foi localizada. A reportagem do Estadão encontrou a Faculdade Maranhense (FAM), que informou que não tem cursos relacionados ao Direito; Outra instituição de nome semelhante, Faculdade Maranhense São José dos Cocais, não se manifestou se o curso é ou foi ofertado e ou se Kassio Marques foi matriculado.
Defesa
Procurado pelo jornal O Globo, Kassio Nunes Marques tergiversou ao se defender: “Além da formação em Direito, não há requisitos mínimos acadêmicos para a posição de desembargador federal ou para a indicação e nomeação de ministro do STF. A apresentação de um currículo, portanto, é um ato de boa-fé, possibilitando à sociedade conhecer as áreas de interesse e especialização do servidor público”, disse o indicado ao Supremo Tribunal Federal.
“São títulos obtidos no Brasil, na Espanha, em Portugal e na Itália. Cada curso respeita, portanto, as regras e orientações de titulação de cada país. Assim, um curso pós-graduação na Espanha, por exemplo, não tem o mesmo significado acadêmico no Brasil”, acrescentou.
Ao Estadão, ele comentou sua postura sobre a defesa ao combate à corrupção, dizendo que “ficaria perplexo se fosse indicado qualquer cidadão brasileiro, seja ele advogado, magistrado, ou outro cidadão, pois a Constituição não exige que seja sequer bacharel em Direito para ser ministro do Supremo Tribunal Federal, que fosse contra o combate à corrupção”.
Em meio a tantas dúvidas, a graduação em Direito pela Universidade Federal do Piauí, não está sob questionamentos, já que a instituição confirmou que Kassio Nunes finalizou o curso em 1994 com Índice de Rendimento Acadêmico de 8.3704 pontos, “sem qualquer registro que desabone sua conduta acadêmica”.
Terrivelmente
O pastor Silas Malafaia, um dos mais agudos críticos da escolha do presidente Jair Bolsonaro, voltou a questionar a indicação de Kassio Nunes e usou as redes sociais para adjetivar como “piada” que o possível futuro ministro do STF tenha um currículo suspeito.
“Tem que dar explicação! Como o indicado para o STF tem 2 pós doutorados, quando acaba de concluir um doutorado? A universidade espanhola nega existência de curso de pós graduação que ele diz ter feito. [Carlos Alberto] Decotelli deixou de ser ministro da educação por muito menos. E AGORA? PIADA!”, disparou o pastor.
Malafaia vem cobrando Bolsonaro pela indicação de alguém que seja “terrivelmente de direita”, valendo-se da expressão cunhada pelo próprio presidente para se referir ao jurista evangélico que ele promete indicar na vaga que será aberta em 2021, quando Marco Aurélio Mello será aposentado compulsoriamente.
TEM QUE DAR EXPLICAÇÃO ! Como o indicado para o STF tem 2 pós doutorados , quando acaba de concluir um doutorado? A universidade espanhola nega existência de curso de pós graduação q ele diz ter feito. Decotelli deixou de ser ministro da educação por muito menos.E AGORA? PIADA!
— Silas Malafaia (@PastorMalafaia) October 7, 2020