O avanço da adesão às igrejas evangélicas na população brasileira, com conversões registradas entre ricos, tem levado especialistas a revisar interpretações consolidadas sobre a expansão desse segmento religioso no país. Historicamente vinculadas às camadas populares e à vulnerabilidade social, as igrejas evangélicas agora conquistam também empresários, artistas e profissionais de alta escolarização.
Segundo o sociólogo Diogo Corrêa, professor da Universidade de Vila Velha e da École des Hautes Études en Sciences Sociales, em Paris, a academia sustentou por muito tempo a ideia de que o crescimento evangélico estava relacionado à precariedade econômica:
“Durante muito tempo, predominou na academia a ideia de que o crescimento dos evangélicos no Brasil estaria ligado diretamente ao déficit econômico, à baixa escolaridade e à precariedade das condições sociais dos adeptos”, afirmou Corrêa em artigo publicado na Folha de S.Paulo.
A presença crescente de fiéis de classes mais altas, no entanto, tem alterado esse cenário. Corrêa cita como exemplo a Lagoinha Global, que criou áreas VIP para celebridades em sua sede localizada em Alphaville, bairro de alto padrão na Grande São Paulo. Para o sociólogo, essa iniciativa “desafia essa interpretação clássica” que associava o movimento evangélico à exclusão social.
No passado, estudos de autores como Fernando Cartaxo Rolim e Cecília Mariz interpretavam o avanço das igrejas pentecostais e neopentecostais como uma resposta à ausência do Estado nas periferias urbanas. As igrejas, segundo essa abordagem, preenchiam lacunas sociais ao oferecer acolhimento espiritual, redes de solidariedade e até apoio financeiro às comunidades empobrecidas. Corrêa aponta ainda um contraste frequentemente observado por esses estudiosos: “Essa abordagem enfatizava ainda um paradoxo incômodo: enquanto líderes religiosos enriqueciam e erguiam templos suntuosos, muitos fiéis permaneciam na pobreza”.
Hoje, o perfil evangélico é mais heterogêneo. Estimativas indicam que os evangélicos representam cerca de 31% da população brasileira, ou aproximadamente 65 milhões de pessoas, de diferentes origens sociais: “Não estamos mais diante apenas de um fenômeno religioso restrito às camadas populares ou marginalizadas, mas sim de uma realidade transversal que inclui representantes das elites sociais, econômicas e culturais”, afirma Corrêa.
A Get Church, localizada em Florianópolis, exemplifica essa nova fase. A influenciadora digital Tâmara Thaynne viralizou ao expressar surpresa com o luxo do templo, que comparou a um shopping center. Após assistir à justificativa do pastor, que afirmou querer “honrar a Deus com excelência” por meio da estrutura, ela mudou sua percepção. Para Corrêa, situações como essa evidenciam uma mudança significativa no entendimento do apelo evangélico: “Trata-se de um fenômeno que desafia diretamente a explicação tradicional”, conclui o sociólogo.
A ampliação do público evangélico, que agora alcança diferentes estratos sociais, sinaliza uma reconfiguração no cenário religioso brasileiro. Para os estudiosos, compreender esse novo perfil é essencial para analisar o impacto sociocultural das igrejas evangélicas no país contemporâneo.